Lembram-se das "Pitas de S. Lázaro", aquele doce amarelo-dourado em forma de "pinto" e com um ovo de recheio que uma senhora de Lamego vinha vender para a parta da Igreja no domingo anterior ao "Domingo de Ramos"? Presumo que era chamado domingo de S. Lázaro porque é o domingo mais próximo do dia em que se celebra S. Lázaro (10 de Abril). Havia mesmo o ditado que então se repatia anualmente: "S. Lázaro, Ramos, na Páscoa estamos!". Hoje pergunto-me porquê essa iguaria, precisamente nesse e só nesse dia? Consta que é um doce típico do Bairro da Ponte (Lamego). Será que a senhora vinha a Penude escorar os excedentes que não vendera nas festa do santo padroeiro da Ponte? Mesmo que assim fosse, nunca mais pude esquecer as fantasias e desejos que esse doce doirado despertava nas minhas infantis entranahas. Há tempos, numa das minhas passagens pela cidade de Lamego, encontrei, com certa surpresa minha, o dito doce à venda. Afinal não estava extinto... Claro que logo comprei para recordar o sabor e reviver velhas sensações. Mas que desilusão!... o pitéu que na infância me fazia arregalar os olhos e crescer água na boca não tinha já o mesmo sabor. Nem “pinta” conservava das delícias da "pita" nem do pitéu da minha infância, a salvava-se o tal ovo com sabor previsível. E, mais uma vez, pude constatar que as delícias e os maiores gozos da vida não têm a ver com o que podemos comprar e ter, mas com o que muito desejamos porque não nos está à mão todos os dias. Tive, mais uma vez, a sensação de que a verdadeira felicidade tem mais a ver com a fome do que com a saciedade. Aquelas "pitas de S. Lázaro" eram, afinal, um símbolo do sonho que comanda a vida e do tesouro e do grande banquete que nos espera na vida eterna. Até lá, a nossa condição terrena é demandante; somos peregrinos e itinerantes num êxodo que nos levará à terra prometida, alimentados pelo maná ideal que é sempre mais gostoso que o real. Esse maná ou essas “pitas douradas” nos sustentam, mas não nos matam a fome, pois esperamos e ansiamos por comer dos frutos da terra da promessa. E mal de nós qundo fizermos da sesta dos saciados o nosso estado de vida: não há outro remédio senão caminhar, pois é melhor morrer a caminho que viver sob o império dos Faraós. Essas "pitas douradas" da nossa infância exprimem a saciedade sempre parcial, a felicidade sempre incompleta que todos buscamos. Quanto mais perscrutamos os mistérios mais insondável se nos revela a vida e a morte, mais sede temos do bem, do verdadeiro, do belo, do infinito. Mas é esta fome e sede que nos move. Até que esse ovo simbólico dê à luz a plenitude da vida.
Isidro Lamelas
Por isso que, quando me vêm falar de progresso, de "Estado social" eu pergunte sempre se esse "progresso", esse "Estado social" trazem ou não mais "felicidade" à humanidade que nessas expressões queremos incluir...Longe de isso ser uma verdade absoluta.
ResponderEliminarÉ que, também existe tanta fome sem remédio na abundância de pão!
Se o homem for mesmo HOMEM, a fome de pão é bem mais secundária que a outra...Se o homem for mesmo HOMEM!
E nós sabemos bem do que falamos, não é meu irmão!!!
Abraço.
filipelamelas